quarta-feira, 25 de junho de 2008

Uefa Euro 2008




De tempos em tempos o futebol, assim como a história, prega peças e causa surpresas. Por essas e outras diz-se que a história da humanidade não é linear. Ela não segue um curso evolutivo e contínuo, como se pensou durante séculos. Pelos mais diversos motivos, períodos de paz foram interrompidos por guerras (Belle Époque e Primeira Guerra Mundial, por exemplo), democracias foram sucedidas por ditaduras (golpe de 1964 suprimindo o regime de 1945, no Brasil) e vários impérios ascenderam e depois caíram.

No futebol também é mais ou menos assim. Quem acompanhou a última Copa do Mundo (Alemanha 2006) certamente se decepcionou com o péssimo futebol apresentado. A decepção foi maior porque, à época, o futebol dava sinais de uma interessante volta à ofensividade. Grandes times da Europa jogavam com três atacantes e sem nenhum volante dos chamados "brucutus". Após esse mundial vi muitos falarem que a prática do futebol defensivo, burocrático e insosso era coisa inevitável nos torneios de seleções. A ofensividade residia e jazia no passado, segundo essas pessoas.

Contudo, eis que a Uefa Euro 2008 (organizada conjuntamente por Suíça e Áustria) trouxe uma grata surpresa. A ofensividade tem sido a tônica do torneio. Com isso, excelentes jogos vêm sendo realizados. Tendo grandes jogos, obviamente, muitas jogadas e jogadores vêm obtendo destaque. Tudo isso, sem se prescindir da competitividade. Dando mostras de que é possível, sim, se jogar de maneira competitiva, pragmática, ofensiva e bonita (tudo ao mesmo tempo).

Como equipes destaco, sobretudo, Rússia e Holanda. Ambas vêm praticando um futebol envolvente, veloz e com muita aplicação tática. Mas, melhor do que isso, essas duas seleções vêm jogando um futebol muito vistoso. Uma intensa movimentação de seus jogadores, os passes de em pé em pé, as tabelas de primeira e as enfiadas de bola entre os zagueiros (no bom sentido) são suas marcas. Valores individuais, elas também têm, sim senhor: Sneijder (jogador completo), Robben (velocidade e habilidade), van Persie (muita habilidade) e van Nistelrooy (técnica e serenidade) são os feras da Holanda. Pavlyuchenko (faro de gol), Zyryanov (boa técnica), Zirkhov (velocidade e bons cruzamentos e arremates) e Arshavin (este um craque) pela Rússia. E detalhe: Rússia e Holanda possuem times jovens. Assim, estarão muito bem em 2010. Logo, é bom o Brasil abrir o olho com eles, afinal, como diria Fernando Vanucci: "a África do Sul é logo ali e a seleção brasileira tem que tomar cuidado para não virar comida de leões"!

Ressalto também o ótimo futebol de Alemanha, Turquia e Espanha. A Alemanha, como quase sempre, está forte, competitiva, disciplinada, técnica, fria e concentrada. Além de todos esses adjetivos, vem jogando um futebol ofensivo e destemido. Destaques: Ballack (jogadoraço), Klose (matador), Schweinsteiger (veloz e inteligente) e Lahm (categoria típica de um jogador ambidestro).

Turquia: raça, entrega, fé, perseverança e energia incríveis. Simplemente conseguiu reverter três resultados, em três jogos, nos acréscimos. Além disso: boa técnica e bons jogadores como: Semih Senturk (artilheiro em momentos importantes) e Nihat (ótimo atacante).

Espanha: sempre possui bons jogadores. Não se sabe ao certo porque não é um time vencedor. Uns especulam que há sempre uma desunião, por motivos étnico-políticos, nas equipes que monta (basco, que não gosta de madrilenho, que não suporta catalão...), outros dizem que os insucessos vêm porque eles amarelam mesmo. Desta vez, a Espanha parece mais unida e focada. Qualidade: David Villa (artilheiro impiedoso), Fernando Torres (um dos melhores atacantes do mundo), Fàbregas (um dos melhores jogadores do mundo) e Xavi (volante técnico e eficiente na marcação).

Seleções decepcionantes: França e Itália. Os franceses precisam se reencontrar sem Zidane. Além disso, muitos jogadores estão velhos. Uma renovação total terá de ser feita. A França começa do zero as eliminatórias para a Copa do Mundo de 2010. E a Itália... a Itália foi a de sempre. Futebol enfadonho, irritante, sem criatividade e ofensividade. Mesmo assim volta e meia os italianos chegam. Sempre aos trancos e barrancos... prorrogações, pênaltis... Desta vez, ainda bem (pelo bem do futebol), eles ficaram nas quartas-de-final.

Jogadores decepcionantes: Cristiano Ronaldo, Petr Cech e Thierry Henry. Ronaldo, o jogador-celebridade, misto de fubolista e artista circense mais uma vez - a exemplo da Copa de 2006 - não jogou nada. Seus dribles - muito eficazes contra Bolton, Wigan ou Fulham na liga inglesa, e contra Andorra, San Marino ou Luxemburgo nas eliminatórias européias - não aconteceram contra os melhores marcadores da Europa. Cech: falhou feio e eliminou sua República Tcheca da competição. Só por isso. Henry: envelhecido e decadente, não jogou nada.

Está aí o balanço da Uefa Euro 2008. Ela está sendo (faltam apenas dois jogos para seu final) uma excelente competição. Vi cinco copas do mundo (1990, 1994, 1998, 2002 e 2006) e cinco eurocopas (1992, 1996, 2000, 2004 e 2008) e a edição 2008 da Euro é a melhor entre as dez. Gostei da Copa do Mundo de 1998 (França), mas esta Euro terá sido melhor. O principal motivo: foi a primeira competição de seleções, verdadeiramente marcada pela ofensividade, que vi. Quanto tempo essa tendência vai durar não se sabe, visto que o futebol, enquanto simulacro da história, é imponderável e segue um curso descontínuo!