quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

E agora, Cuba?




Esta semana, el comandante Fidel Castro anunciou que está deixando, definitivamente, o poder em Cuba. Fidel era o presidente do Conselho de Ministros (chefe de governo), desde 1959; comandante em chefe das Forças Armadas, desde 1976; e presidente do Conselho de Estado (chefe de Estado),desde 1976. Em 2006, devido a uma doença intestinal de Fidel Castro, todas essas funções já haviam sido transferidas, provisoriamente, para Raul Castro, seu irmão mais novo. Mas e agora, o que será de Cuba?

Tudo é muito incerto. A primeira hipótese é que Raul Castro continue exercendo as três funções e não haja nenhuma grande mudança no regime. A segunda é que Raul divida o poder e continue sendo só chefe de governo. Nesse caso, algumas mudanças poderão acontecer. De todo modo, os cubanos exilados que vivem na Flórida começam aos poucos a se mexer. Eles, por exemplo, influenciaram e garantiram uma ampla vitória para o candidato John McCain, nas primárias republicanas no estado da Flórida. McCain já declarou na campanha presidencial que pretende continuar o processo de asfixia total à Cuba, discurso que converge totalmente com as posições dos exilados cubanos, visto que eles um dia pretendem retornar à ilha e ganhar o poder. Nesse sentido, a continuação do embargo econômico representa o enfraquecimento do regime castrista, na visão dos cubanos da Flórida.

As incertezas só aumentam quando se cogita o que acontecerá depois da morte de Fidel Castro (81 anos). Como se isso não bastasse, Raul Castro (76 anos), em tese, também não viverá muitos anos. Portanto, serão os políticos mais jovens de Cuba que deverão tomar conta do país em breve. Com forte pressão dos exilados, obviamente.

O regime de Fidel construiu uma sólida estrutura social na ilha. Alguns indicadores sociais são equivalentes ou melhores do que os de países do chamado primeiro mundo. Nas áreas de educação, esporte e saúde, Cuba dá um banho. Pode-se se citar como exemplo o fato de a mortalidade infantil em Cuba ser menor do que em Nova Iorque. De outro lado, para garantir tudo isso Fidel governa de maneira autoritária, não permitindo dissuasões.

É muito problemática a dicotomia liberdade/igualdade (duas das três bandeiras da Revolução Francesa). Afinal, ao promover-se a igualdade poda-se a liberdade e vice-versa. Fidel tornou a ilha mais humana e igualitária, mas para tanto suprimiu algumas liberdades civis e políticas. Ao contrário disso, a maioria dos países capitalistas (vide o Brasil) promove uma ampla liberdade, principalmente de mercados e capitais, e constrói fortes desigualdades, já que nesse caso vale o salve-se quem puder.

Acredito eu que a maioria dos cubanos sabem mensurar tudo isso. Eles sabem que não têm liberdade para criticar o regime ou para ter acesso a todos os bens de consumo que o capitalismo oferece. Mas também sabem que têm educação e saúde de qualidade e mais do que isso vivem num país com índices de criminalidade ínfimos. Vale lembrar que nas pesquisas de opinião, os eleitores brasileiros sempre colocam segurança, saúde e educação entre os principais problemas a serem resolvidos pelo Estado. Em Cuba tais problemas praticamente inexistem. Em suma, se existem muitos cubanos que deixaram ou pensam em deixar o país, há inúmeros outros que demonstram o desejo contrário. Talvez o exemplo mais emblemático disso seja o boxeador Teófilo Stevenson (tricampeão olímpico). Ele inúmeras vezes foi convidado a deixar Cuba para lutar boxe profissionalmente nos EUA e tornar-se um milionário. Stevenson recusou todas as propostas alegando que sem o regime castrista provavelmente não teria tido uma boa educação e nem aprendido a lutar boxe. Em outras palavras, sabe que poderia não ter chegado a lugar nenhum sem o respaldo das práticas socialistas, ou seja, que sua brilhante carreira foi fruto de um esforço coletivo.

Portanto, pode ser que a maioria dos cubanos desejem a livre iniciativa e maiores oportunidades de consumo. Porém, duvido que eles queiram isso em detrimento do que foi conquistado em termos sociais. Alguns países do leste europeu se arrependem até hoje de terem jogado fora totalmente as benesses do período socialista, em nome de uma transição "tudo ou nada" para o sistema capitalista.

Para finalizar, é muito provável que haja mudanças em Cuba pós-Fidel Castro, no entanto é desejável que ainda permaneça vigorando na ilha a belíssima frase: hoje, em todo o mundo, milhões de crianças dormirão nas ruas, nenhuma delas é cubana!

3 comentários:

chico macedo disse...

oi, bruno - sobre a questão liberdade/igualdade em Cuba cito, mais uma vez, Gerson (ou um dos gêmios do episódio do Chapolin dos dançarinos - Carlos Villagran) e aula em que nos passou o filme Morango e Chocolate, que problematiza essa questão. Continue postando.

abraço, chico.

Andrecatuaba disse...

O regime cubano tem virtudes e defeitos, como todos os outros. Não é legal ficar endeusando um cara que mandou fuzilar milhares e que ficou no poder mais tempo que o ditador (Fulgêncio Batista) que ele próprio derrubou. Cuba é a dysneilandia dos esqueristas, que vão ver el comandante como os japas vão tirar fotos com o mickey. Deve-se elogiar os seus índices sociais, mas também criticar a falta de oposição. Nem tanto ao céu nem tanto à terra...

Sérgio Bertoldi disse...

A liberdade é, no ramo jurídico, um direito primário, essencial. Foi a primeira das conquistas efetivas das nações modernas, contra o já irracional absolutismo de seu tempo. Transfigura-se no que chamamos de "direitos políticos".

Já a igualdade, em seu sentido material, é uma luta ainda em aberto pelos direitos de segunda geração, os direitos sociais!...requeridos diante da nova e péssima configuração de vida humana trazidas pelo mundo industrializado. Em resumo, são as necessidadeds de trabalho, casa, comida e lazer dignos do homem e da mulher (q tb teve q buscar sua igualdade)...enfim... os direitos da vida plena.

Interessante e inversamente, em Cuba a conquista dos direitos sociais deu-se na frente dos políticos.

Em todo caso, nao deixa de ser um caminho interessante e condizente com uma teoria pensada em outro ramo das ciências humanas: a psicologia. Mais exatamente, a pirâmide das necessidades de Maslow (se nao me engano...nunca sou bom com nomes).

Nessa pirâmide estaria representada a ordem das necessidades individuais do ser-humano. A primeira delas, então, é exatamente a necessidade de sobrevivência!! Diz que a primeira coisa que move o homem, ou seja, sua necessidade mais primitiva, é a de viver! (ou seja, simplesmente: ter saúde e o que comer!)

Daí então viriam as necessidades de Segurança, Afeto, Reconhecimento Social e Auto-Realização. (Teoricamente, nesta ordem!)

Ou seja, se comparássemos Cuba a uma pessoa, ela já estaria, a princípio, com suas necessidades vitais satisfeitas. Falta então, ela seguir o caminho até sua realização plena...um caminho que passa necessariamente pela liberdade, pelo "reconhecimento social" dos indivíduos e seus anseios. Tudo, claro, tem que ser feito e conduzido de forma inteligente e gradual, para que suas estruturas/ instituições e pessoas nao sejam engolidas pela água do mundo desconhecido que a cerca. Para que a "luz" nao cegue quem tá por muito tempo no escuro.

E sim...já q estou caminhando pra exemplos clichês mesmo, vou terminar com mais um: do que adianta o dono dispensar os melhores cuidados ao seu belo pássaro, se ainda o mantém preso à gaiola?! :/

Liberdade...ainda que tardia!